Enfermeiros portugueses ganham 3,5 vezes menos do que os luxemburgueses
Enfermeiros portugueses são poucos e os que existem ganham mal. Para Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem do Enfermeiros, falta essencialmente “vontade política” para alterar a situação. “Temos ainda de correr muito para chegar à média da OCDE.”
Em 21 países, Portugal é o 19.º em número de enfermeiros por cada mil habitantes e foi ultrapassado em número de profissionais em países como Roménia, Lituânia e Malta. Além do mais, e de acordo com o mais recente relatório da OCDE, ganha-se em Portugal três vezes e meia menos do que no Luxemburgo. Para a bastonária da Ordem do Enfermeiros, bastaria “vontade política” para que “a escassez de profissionais e uma remuneração mais digna” se resolvessem. Ana Rita Cavaco também culpa o Governo pelo facto de “estarmos a formar enfermeiros para os entregar a outros países”.
Para ler depois
Sindicato alerta para “discrepâncias” na aplicação da progressão salarial dos enfermeiros
O Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor) alertou hoje a direção executiva do SNS (DE-SNS) para discrepâncias na aplicação do diploma sobre a progressão salarial que estão a criar injustiças entre esses profissionais de saúde (… continue a ler aqui)
No Reino Unido – para onde a maior parte dos enfermeiros formados no nosso país emigram –, e apesar de receberem quase o dobro do salário anual, luta-se por aumentos, após anos de cortes e o enorme fardo da pandemia. Na Grã-Bretanha, os enfermeiros protestam devido ao stresse e às longas horas de trabalho, enquanto os pacientes enfrentam elevados tempos de espera. Um retrato em tudo semelhante ao português, exceto no salário.
De acordo com uma análise da SkyNews, os os profissionais da saúde britânicos estão a ganhar em termos reais menos do que em 2010, entre eles os enfermeiros residentes e contratados, que perderam 10,2% do rendimento. O Governo britânico afirma que um aumento salarial de 10%, ou mais, “agravaria ainda mais a inflação”. No entanto, regista-se algum progresso, com negociações a decorrerem entre sindicatos e Downing Street, que levaram, de resto, ao cancelamento de várias das greves de enfermeiros.
Só Lituânia e Letónia têm menos enfermeiros do que Portugal
O gráfico – mais abaixo neste artigo – reflete o salário médio de um enfermeiro em vários países, de acordo com os dados mais recentes da OCDE, com taxa de câmbio e poder de compra usados para contabilizar as diferenças de custo de vida entre os países. O gráfico não leva no entanto em conta os bónus pagos pelos governos como remuneração durante a pandemia de covid-19.
Os enfermeiros no Luxemburgo tiveram o salário médio mais alto em 2020 dos países da OCDE, 103.963 dólares anuais (95 mil euros). Isto é aproximadamente o dobro do dos enfermeiros no Reino Unido, após o ajuste de custo de vida. Portugal está entre os países com os salários mais baixos, 28.848 dólares (pouco mais do que 26 mil euros por ano).
A plataforma digital de saúde Qunomedical, que realizou uma consulta sobre o assunto, diz que “embora enfermeiros hospitalares, clínicos gerais e médicos de emergência no Reino Unido ganhem mais do que a média nacional [de outras profissões], isto não leva em conta as horas extras a que estão obrigados”. “Em 2019, 43,4% dos trabalhadores do SNS britânico relataram trabalhar todas as semanas até 5 horas extra [apesar de tudo, menos numa semana do que os enfermeiros portugueses num só dia], e é provável que estes números tenham aumentado drasticamente devido à atual pandemia”, conclui-se.
Statista
Só a “vontade política” pode resolver a falta de enfermeiros – Ana Rita Cavaco em entrevista
A Ordem dos Enfermeiros assinala que “o relatório Health at a Glance 2022, da OCDE e da Comissão Europeia, mostra que os enfermeiros portugueses continuam a ser dos mais mal pagos da Europa, bem como o rácio destes profissionais continua a ser inferior à média europeia”. Enquanto a média dos países da UE era, “em 2020, de 8.3 Enfermeiros por mil habitantes, em Portugal esse número não vai além de 7,3 por mil habitantes”, tendo sido já ultrapassado “por países como Roménia, Lituânia e Malta”.
Entre 2010 e 2020, “o número de enfermeiros per capita aumentou na maioria dos países da UE, e os enfermeiros superam os médicos”. Em 2020, havia mais de dois enfermeiros por médico em média entre os países da UE, mas esta proporção “não se verifica nos países do sul da Europa”, incluindo Portugal: “um enfermeiro por cada três médicos, sendo um dos piores rácios, só à frente de Bulgária, Letónia e Chipre”.
Quanto à remuneração, Portugal está também “na cauda da OCDE”, só à frente de Letónia e Lituânia. Numa lista com 21 países, Portugal surge na 19ª posição. Luxemburgo e Bélgica são os países que melhor pagam aos enfermeiros, razão pela qual “conseguem atrair um grande número” de profissionais de outros países, “incluindo de Portugal”.
Este relatório alerta ainda para que a procura por enfermeiros continue a aumentar, “devido ao envelhecimento da população, por um lado, e ao número de enfermeiros que estão a aproximar-se da idade da reforma”.
Texto: Luís Martins
Siga a Impala no Instagram