Violações dos direitos humanos agravaram-se em Angola no segundo trimestre
Execuções sumárias, torturas, intimidações e detenções arbitrárias são relatadas num novo relatório do movimento cívico Mudei que fala num agravamento das violações dos direitos humanos em Angola, no segundo trimestre de 2024, e critica a “banalização” da vida.
De acordo com o relatório da organização não-governamental angolana, consultado hoje pela Lusa, no período observado, ocorreu um agravamento em relação ao anterior trimestre, tendo-se registado execuções sumárias e uma morte devido a tortura alegadamente executada por agentes afetos ao Serviço de Investigação Criminal (SIC), no interior de uma esquadra da Polícia Nacional.
A banalização do bem jurídico “vida” é um indício da natureza do Estado que vigora em Angola, destaca o relatório, que reporta casos registados nos meses de abril, maio e junho passados, nas províncias de Luanda, Bié e Lunda Norte.
Os jovens, sobretudo ativistas, são as principais vítimas dos atos registados neste período, segundo o mesmo documento.
O Mudei descreve que, no princípio de junho, pelo menos 10 jovens e adolescentes residentes no bairro da Vidrul, município de Cacuaco, terão sido raptados por supostos agentes do SIC, tendo sido encontrados os cadáveres, dias depois, na morgue de um hospital, “com evidentes sinais de tortura e perfuração de balas”.
“Existem relatos de outras sete pessoas executadas em outros bairros de Cacuaco na mesma semana”, lê-se no documento, o qual refere existirem “fortes indícios” que sugerem a violação do princípio da proibição da pena de morte ou execução sumária para os referidos casos.
Há também no relatório referência à morte de três membros da mesma família (pai, filho e neto) “executados à queima-roupa” no município do Cazenga, em Luanda, por um agente do SIC, como confirmou, na ocasião, o porta-voz deste serviço, Manuel Halaiwa, referindo que o autor, que à data se encontrava em parte incerta, os confundiu com “meliantes”.
Halaiwa, citado na altura pelo Jornal de Angola, assegurou que as vítimas não eram meliantes, mas sim membros da mesma família, que saíam de um óbito e ao chegar a casa, por falta de chaves, um tentou escalar o muro, tendo sido confundidos com marginais.
Pelo menos cinco jovens foram detidos e submetidos a tortura e tratamento degradantes em esquadras policiais, em maio, no município do Kilamba Kiaxi, em Luanda, após serem surpreendidos no local de trabalho, sendo que, 14 dias depois de “cárcere privado”, um deles acabou por morrer, refere-se no relatório.
O documento, elaborado pelo Mudei em parceria com a organização comunitária Mizangala Tu Yenu Kupolo e com a Handeka, anexa imagens de algumas das vítimas e manifesta oposição ao “permanente estado de selvajaria em que a lei escrita é letra morta”.
Relata igualmente casos de intimidação, pressão psicológica e restrições de circulação a um comentador de uma rádio na província do Bié, atos praticados supostamente por efetivos da polícia local, em abril.
Um ativista foi detido na Lunda Norte por agentes do SIC, em maio, por ter denunciado alegados atos de corrupção por parte dos responsáveis do Programa Kwenda (programa de transferências monetárias para famílias vulneráveis), acrescenta, relatando ainda cenas de intimidações de um outro ativista em Luanda, em junho.
As detenções arbitrárias de ativistas cívicos e execuções sumárias de cidadãos, “além de preocupantes, exigem uma intervenção urgente para impedir que se repitam e que os seus perpetradores fiquem impunes”, defende o Mudei.
“Lamentavelmente, em pleno 2024, vivemos situações de decadência social que nos obrigam a elaborar relatórios deste tipo, de forma rotineira, com o intuito de tentar chamar a atenção e frear algumas destas práticas aberrantes, responsabilizando-se os prevaricadores”, salienta a organização.
A Mudei apela a um Estado “onde a vida de cada pessoa seja valorizada como um bem inalienável, onde os direitos constitucionais e demais legislações em prol dos direitos humanos sejam rigorosamente respeitados e onde os órgãos de defesa e segurança compreendam plenamente a sua missão e função: proteger, zelar pela vida e dignidade da pessoa humana, em vez de agir como criminosos, com arbitrariedade e violência”.
DYAS/RCR // MLL
By Impala News / Lusa
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