Críticas a venda de portos do Panamá não refletem posição de Pequim — analista

Um analista chinês negou que o comentário publicado por um jornal de Hong Kong sobre a venda dos portos do Panamá pelo conglomerado CK Hutchison à norte-americana BlackRock represente a posição oficial de Pequim

Críticas a venda de portos do Panamá não refletem posição de Pequim -- analista

*** João Pimenta, da agência Lusa ***

 

“O negócio da CK Hutchison é um acordo puramente privado” e “de modo algum o comentário representa a posição oficial da China”, afirmou à agência Lusa Gao Zhikai, que serviu como intérprete do antigo líder chinês Deng Xiaoping e é atualmente um dos mais conhecidos comentadores da televisão chinesa.

Os portais oficiais da administração chinesa em Macau e Hong Kong divulgaram na sexta-feira o comentário, difundido pelo jornal Ta Kung Pao, uma publicação da antiga colónia britânica vista como sendo próxima de Pequim.

O jornal considerou que o negócio que transferiu para um consórcio que inclui a BlackRock e a Terminal Investment Limited uma participação de 80% num conjunto de subsidiárias portuárias, que gerem 43 portos em 23 países, incluindo os portos em ambas as extremidades do Canal do Panamá, em Balboa e Cristobal, “não é uma prática comercial normal”.

“Muitos internautas [chineses] criticaram fortemente este acordo e a CK Hutchison Holdings, considerando-o como uma cedência sem espinha, visando apenas o lucro e esquecendo a justiça, ignorando os interesses nacionais e os grandes princípios nacionais, traindo e vendendo todo o povo chinês. Estas expressões emocionais são completamente compreensíveis”, lê-se.

Lembrando que Hong Kong “goza de liberdade de imprensa” e que “podem escrever o que quiserem”, Gao Zhikai afirmou que a publicação está “provavelmente a exagerar”.

O analista apontou uma das máximas do dono da CK Hutchison Holdings, o bilionário Li Ka-shing, para justificar o negócio: “Tudo pode ser vendido. É apenas uma questão de preço”.

“Ora bem, a empresa concluiu que o preço que o comprador norte-americano ofereceu é um bom preço, ou mesmo irrecusável, e essa é a principal razão por detrás do acordo”, frisou.

“O Governo chinês não tem nada a ver com este negócio”, acrescentou.

O acordo, anunciado em 04 de março, está avaliado em 22,8 mil milhões de dólares (21,03 mil milhões de euros).

Concluído sob os auspícios dos Estados Unidos em 1914, o Canal do Panamá, que atravessa a América Central, tornou-se um dos alvos do Presidente norte-americano, Donald Trump, assim que regressou à Casa Branca em 20 de janeiro. Trump acusou a China de dominar as operações no canal e prometeu “tomá-lo de volta”.

O comentário publicado pelo Ta Kung Pao sublinhou ainda que a notícia do negócio foi conhecida após a visita do secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, ao Panamá, e “na véspera do primeiro discurso de Trump ao Congresso”.

“Terá sido apenas uma coincidência? Qual era a natureza do acordo?”, interrogou.

A publicação alertou para a “americanização e politização” do Canal do Panamá: “O comércio marítimo da China estará definitivamente sujeito aos Estados Unidos”.

Sobre aquela possibilidade, Gao Zhikai foi enfático: “Alguém que acredita que o controlo de duas partes no Canal do Panamá ou do cabaz de portos envolvidos nesta transação em particular vai afetar a liderança da China no transporte de contentores ou na construção naval está a fantasiar”.

Na última década, o país asiático construiu de raiz ou comprou participações maioritárias numa vasta rede de portos fundamentais para o comércio mundial, desde o Pireu, na Grécia, a Gwadar, no Paquistão.

Em 2024, inaugurou um gigantesco porto no Peru, que visa servir como centro logístico na região e um ponto de ligação crucial entre a América do Sul e o Indo-Pacífico.

Segundo o grupo de reflexão Council on Foreign Relations, as empresas estatais chinesas detêm participações em cerca de 100 portos em 64 países, em todos os oceanos e continentes, exceto na Antártida. A própria China alberga oito dos dez maiores portos de contentores do mundo.

O país asiático modernizou também as suas forças navais e tem agora a maior marinha do planeta.

 

JPI // VQ

By Impala News / Lusa

Impala Instagram


RELACIONADOS