Diretor-Geral de Saúde dos EUA declara violência armada emergência de saúde pública

O Diretor-Geral de Saúde dos Estados Unidos declarou hoje que a violência armada é uma crise de saúde pública, devido ao rápido crescimento do número de mortos e feridos com armas de fogo no país.

Diretor-Geral de Saúde dos EUA declara violência armada emergência de saúde pública

O parecer emitido por Vivek Murthy, o mais alto responsável médico dos Estados Unidos, foi emitido depois de o país enfrentar mais um fim de semana de verão marcado por tiroteios em massa que fizeram dezenas de mortos e feridos.

“As pessoas querem poder andar pelos seus bairros e estar seguras”, declarou Murthy, numa entrevista por telefone à agência de notícias norte-americana Associated Press (AP).

“A América deveria ser um sítio onde todos pudéssemos ir para a escola, para o trabalho, ao supermercado, ao nosso lugar de culto, sem termos de nos preocupar com que tal possa pôr a nossa vida em risco”, sustentou.

Para reduzir o número de mortes por armas de fogo, Murthy apela às autoridades norte-americanas para que proíbam as espingardas automáticas, imponham de forma generalizada o controlo de antecedentes na compra de armas, regulamentem a indústria, aprovem leis que restrinjam a sua utilização em espaços públicos e penalizem as pessoas que não guardem as suas armas em segurança.

Nenhuma destas sugestões pode ser aplicada a nível nacional sem legislação aprovada pelo Congresso, que normalmente recua em relação a medidas de controlo de armas. Contudo, alguns parlamentos estaduais adotaram ou poderão considerar algumas das propostas do Diretor-Geral de Saúde.

Segundo o responsável, existe um “amplo consenso” de que a violência armada é um problema, referindo uma sondagem realizada no ano passado que revelou que a maioria dos cidadãos norte-americanos se preocupa, pelo menos algumas vezes, com a possibilidade de um familiar ser ferido por uma arma de fogo.

Em 2022, mais de 48.000 norte-americanos morreram de ferimentos causados por armas de fogo.

Os médicos rapidamente elogiaram o conselho de Murthy. A Academia Norte-Americana de Médicos de Família, por exemplo, considera há mais de uma década a violência armada uma epidemia de saúde pública.

“Os médicos de família há muito entenderam, e viram em primeira mão, o impacto devastador que a violência com armas de fogo tem nos nossos doentes e nas comunidades que servimos”, declarou o presidente do grupo, Steven Furr, num comunicado.

O apelo de Murthy promete, no entanto, ser controverso junto do ‘lobby’ das armas e certamente irritará os congressistas Republicanos, a maioria dos quais se opôs – duas vezes – à sua confirmação no cargo, por causa das suas declarações sobre a violência armada.

A National Rifle Association (NRA, Associação Nacional de Espingardas) criticou prontamente o conselho de Murthy.

“Isto é uma extensão da guerra do Governo [do Presidente norte-americano, Joe] Biden contra os proprietários de armas cumpridores da lei”, sublinhou o presidente da organização, Randy Kozuch, num comunicado divulgado na rede social X (antigo Twitter).

Foram a NRA e os Republicanos que desfrutam do apoio do poderoso ‘lobby’ das armas que quase impediram a confirmação de Murthy como Diretor-Geral da Saúde, há uma década.

Murthy tornou-se mais silencioso sobre a questão da violência armada depois de as suas anteriores declarações quase lhe terem custado o cargo e acabou por prometer ao Senado que “não tencionava usar o cargo de diretor-geral como um púlpito para o controlo de armas”.

Em 2017, o então Presidente, Donald Trump, demitiu Murthy, mas o Democrata Joe Biden nomeou-o de novo para o cargo, em 2021.

Murthy tem publicado alertas sobre tendências preocupantes para a saúde da sociedade norte-americana, entre as quais a solidão e a utilização de redes sociais.

Este mês, num artigo de opinião no diário The New York Times, afirmou que as redes sociais contribuíram para uma crise de saúde mental entre os jovens do país e instou o Congresso a impor rótulos de advertência nas plataformas digitais semelhantes aos patentes nos maços de cigarros.

Mas também tem enfrentado crescente pressão por parte de alguns médicos e grupos ativistas Democratas para se pronunciar mais. Um grupo de quatro antigos Diretores-Gerais de Saúde pediu em 2022 ao Governo Biden que elaborasse um relatório sobre o problema.

“Está na altura de retirarmos esta questão [do controlo de armas de fogo] do domínio da política e colocá-la no domínio da saúde pública, como fizemos com o tabagismo há mais de meio século”, disse Murthy à AP.

Foi um relatório de 1964 do então Diretor-Geral de Saúde que aumentou a consciencialização sobre os perigos do tabagismo e é largamente creditado como tendo reduzido o consumo de tabaco e desencadeado a regulamentação do setor.

Murthy espera agora que o seu parecer sobre as armas mude também perspetivas sobre esta questão. Ele tem sido encorajado por alguns desenvolvimentos no Congresso, incluindo a aprovação da Lei Bipartidária das Comunidades Mais Seguras em 2022, que melhorou as verificações de antecedentes relacionados com armas de fogo.

Um relatório da Casa Branca a que a AP teve acesso indica que verificações de antecedentes mais completas impediram cerca de 800 vendas de armas de fogo a menores de 21 anos.

Além disso, mais de 500 pessoas, entre as quais algumas ligadas a cartéis transnacionais e redes de crime organizado, foram acusadas de tráfico de armas e outros crimes ao abrigo da histórica legislação sobre segurança de armas.

As crianças e os jovens norte-americanos, em particular, estão a sofrer com a violência armada, observa Murthy no seu parecer, intitulado “Violência com armas de fogo: Uma Crise de Saúde Pública na América”.

As taxas de suicídio com armas de fogo aumentaram em quase 70% para as pessoas com entre 10 e 14 anos de idade. As crianças nos Estados Unidos têm muito maiores probabilidades de morrer devido a ferimentos provocados por armas de fogo do que as crianças noutros países, demonstra a informação que coligiu.

Mesmo quando as crianças não são vítimas diretas de um tiroteio, podem sofrer as consequências da violência armada na sua saúde mental, segundo o relatório.

Cerca de metade dos adolescentes nos Estados Unidos preocupam-se com a hipótese de um tiroteio na escola. E em zonas que foram alvo de um tiroteio fatal numa escola, o uso de antidepressivos por jovens aumentou em mais de 20%.

Além de nova regulamentação, Murthy apela para um aumento da investigação sobre a violência armada no país e para que o sistema de saúde nacional promova e eduque os doentes sobre a segurança das armas e o seu armazenamento adequado durante as consultas regulares.

ANC // PDF

By Impala News / Lusa

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