Por que preferem as mulheres ficar sozinhas numa floresta com um urso do que com um homem

A maioria das mulheres preferiria ter um encontro inesperado na floresta com um urso do que com um homem. A escolha – proposta nas redes sociais – está a chocar os homens

Por que preferem as mulheres ficar sozinhas numa floresta com um urso do que com um homem

Preferes ficar sozinha na floresta com um urso ou um homem? Esta é a questão que atualmente divide as redes sociais. Com base nas respostas online, aparentemente a maioria das mulheres que respondem à pergunta dizem que escolheriam o urso, decisão que está a chocar muitos homens.

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As reações revelam que alguns homens não entendem as experiências femininas. A afirmação de que as mulheres prefeririam encontrar um urso baseia-se em evidências sobre a taxa de violência masculina contra as mulheres e numa vida inteira a aprender a temer e a antecipar este tipo de violência. A experiência é especialmente verdadeira no caso da violência sexual, que não estaria associado ao encontro com um urso.

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De acordo com a Organização Mundial da Saúde, uma em cada três mulheres – cerca de 736 milhões em todo o mundo – terá sofrido violência sexual ou física por parte de um parceiro íntimo ou violência sexual por parte de um não-parceiro durante a vida. Este número permaneceu praticamente inalterado ao longo da última década.

Ser atacado por um urso é muito menos comum, com apenas 664 ataques em todo o mundo ao longo de 15 anos, e muito poucos ataques fatais. Os ursos tendem aliás a evitar os humanos, investindo apenas quando provocados ou para protegerem as crias.

Não se trata de generalizar ou de temer todos os homens. As mulheres sabem que nem todos os homens são perigosos, mas não sabem quais os homens que devem temer, apenas que a violência masculina e o direito masculino aos corpos das mulheres é algo contra o qual apreenderam que devem estar atentas.

As mulheres são frequentemente vítimas de violência sexual e os homens são esmagadoramente os perpetradores (incluindo contra outros homens). Existem muitos homens agressores ou capazes de agredir mulheres, e as mulheres não têm como distingui-los. Embora grande parte da violência contra as mulheres venha de homens que elas conhecem, o risco de perigo por parte de homens que não conhecem é algo que lhes influencia a vida quotidiana.

Por exemplo, uma investigação mostra que as mulheres mudam o comportamento – tomando determinadas decisões sobre os caminhos que tomam ou o que vestem – para evitar assédio ou abuso por parte dos homens em público. Investigadores como Fiona Vera-Gray referem-se a isto como trabalho de segurança.

A visão que as mulheres têm dos homens também é influenciada pelas ações não violentas que prejudicam as mulheres. Claramente, os ursos também não contribuem nem defendem o sexismo e a misoginia sistémicos, mas a maioria dos homens fá-lo.

A investigação de Lisa Sugiura – professora licenciada em Crime Cibernético e Género da Universidade de Portsmouthsobre – sobre grupos misóginos online explorou a forma como os homens se envolvem em atos contra as mulheres que reforçam a desigualdade de género.

A escritora Emma Pitman descreveu este fenómeno através da analogia de uma pirâmide humana. A escolha de alguns homens de permanecerem calados sobre o abuso é a base da pirâmide, sustentando outros homens que se envolvem em piadas misóginas ou cometem violência.

O efeito global, seja deliberado ou por ignorância ou indiferença, “é normalizar e apoiar as ações dos predadores sexuais masculinos e dos perpetradores de violência doméstica”, diagnostica Sugiura.

Esta cultura “apoia os homens que são espetadores silenciosos, os que observam o sexismo, o assédio ou o abuso e permanecem indiferentes, fazem ou riem com piadas sexistas ou de violação, são apologistas da violação e culpam as mulheres pela sua vitimização sexual, se tornam agressivos quando as mulheres os rejeitam, perseguem, controlam e abusam das mulheres ou que são violadores, assediadores sexuais e assassinos”. “Este contínuo de misoginia é a realidade quotidiana das mulheres”, assegura.

Comportamento masculino defensivo

Os homens “ficam geralmente surpresos, e até mesmo na defensiva, quando o assunto da violência masculina contra as mulheres é discutido”, garante Lisa Sugiura. “Muitas vezes, é aqui que as pessoas invocam a resposta ‘nem todos os homens’.”

Quando as mulheres recorreram às redes sociais para expressar raiva e devastação após o assassinato de Sarah Everard por um agente da polícia em 2021, #NotAllMen tornou-se uma tendência online. Entretanto, a polícia aconselhou as mulheres a não andarem sozinhas à noite, “colocando sobre elas o fardo de evitar a violência” – critica a professora.

“A conversa é sobre privilégio, e não sobre reconhecê-lo. Muitos homens são capazes de viver as suas vidas diárias sem se preocuparem com a possibilidade de serem atacados ou violados, podem andar sozinhos na noite sem tomar quaisquer precauções de segurança ou mesmo sem ter tais pensamentos, e não sentem o coração acelerar se ouvirem passos atrás”, alerta Lisa Sugiura. Podem não ser “todos os homens, mas são todas as mulheres”, que vivem “vidas mais recatadas, devido à ameaça da violência de alguns homens”.

“Estas discussões são uma oportunidade para os homens compreenderem os medos genuínos das mulheres e fazerem parte da solução e não do problema”, conclui Lisa Sugiura.

The Conversation

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